A Corte Especial do STJ reconhece a possibilidade de flexibilizar a proteção ao salário em casos excepcionais para quitação de dívidas não alimentares. No julgamento do ERESP 1.874.222, a Corte decidiu que a impenhorabilidade salarial pode ser relativizada, mesmo que o devedor receba um valor abaixo de 50 salários mínimos mensais, desde que se preserve uma quantia suficiente para garantir uma vida digna ao devedor e sua família.
Para o relator, Ministro João Otávio de Noronha, a relativização pode ser aplicada apenas quando outros meios de execução não forem possíveis, e levando em consideração o impacto da penhora sobre a renda do devedor. No caso dos autos, o credor recorreu de uma decisão da Quarta Turma do STJ, que negou a penhora de 30% do salário do devedor, aproximadamente R$ 8.500, para pagamento de uma dívida originada de cheques no valor de cerca de R$ 110 mil.
Naquela oportunidade, a Quarta Turma entendeu que a jurisprudência do STJ permite exceções à regra da impenhorabilidade salarial em duas situações: a primeira, para o pagamento de pensão alimentícia, independentemente do valor da remuneração; e a segunda, para o pagamento de outras dívidas não alimentares, quando a remuneração do devedor for superior a 50 salários mínimos mensais. Em ambos os casos, deve-se preservar um percentual que garanta a dignidade do devedor e sua família.
Contudo, o credor citou decisões anteriores da Corte Especial e da Terceira Turma, que permitiram a penhora de salários apenas levando em conta a preservação da subsistência digna do devedor e sua família, independentemente do tipo de dívida ou dos rendimentos do devedor. Assim, a questão era definir se a proteção ao salário, no caso de dívidas não alimentares, deveria ser condicionada apenas à garantia de subsistência digna ou se também deveria ser observado o limite mínimo de 50 salários mínimos.
No âmbito da Corte Especial do STJ, o relator afirmou que o CPC, ao excluir a palavra “absolutamente” do artigo 833, passou a tratar a impenhorabilidade como relativa, permitindo sua flexibilização mediante análise de princípios e critérios de razoabilidade e proporcionalidade. O ministro criticou o limite de 50 salários mínimos, considerando-o distante da realidade brasileira e ineficaz.
Portanto, a Corte Superior entendeu que é possível flexibilizar o parágrafo 2º, do artigo 833, do CPC, autorizando a penhora de valores salariais abaixo de 50 salários mínimos, em percentuais adequados ao caso concreto, desde que garantida a dignidade do devedor e de sua família, seguindo os critérios de razoabilidade e proporcionalidade.